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Minha história

O objetivo dessa história é insipirar e desiludir quem acha que vai resolver a apneia sem mais nem menos. Quero resaltar a seriedade da doença, os efeitos.

2023

Janeiro

Desde janeiro deste ano, eu vivia um turbilhão de emoções. Havia semanas em que me sentia completamente esgotado e outras em que a vida parecia estar nos eixos. A causa desse descompasso era um mistério para mim, mas não achava que fosse necessário iniciar uma investigação profunda. Afinal, não era incomum ouvir reclamações sobre problemas de sono.

Eu estava completamente no escuro sobre o que era uma polisomnografia e como poderia obter uma. Para os médicos, eu era apenas um jovem magro e saudável, e parecia que tudo se resumiria a uma questão psicológica. Eles me davam conselhos como “melhorar a higiene do sono”, manter horários regulares, evitar telefones antes de dormir, reduzir atividades estimulantes à noite, eliminar a luz azul, meditar ou ler antes de deitar. Era como se estivessem jogando uma receita genérica contra um problema que, para mim, era muito mais complexo.

O problema não era constante; parecia vir e ir com a fluidez das ondas do mar. Às vezes, quando eu conseguia uma noite de sono tranquila, pensava que tinha superado o desafio e deixava de pensar nisso. Mas quando o caos se instalava novamente, eu me lançava em uma busca frenética por soluções: um pouco de Rivotril aqui, um antidepressivo acolá, melissa, melatonina, novos travesseiros… Tudo parecia uma tentativa desesperada de restaurar um equilíbrio perdido.

Outubro

Decidi ir à praia com alguns amigos. Durante sete dias sob o mesmo teto, cheguei a uma conclusão dolorosa:

eu estou doente!

Seguimos uma rotina quase idêntica: mesmos horários de sono, mesmas refeições, o mesmo ambiente. Enquanto meus amigos desfrutavam a viagem, eu estava exausto e derrotado o tempo todo.

Ficou claro que algo estava profundamente errado comigo, e ninguém parecia ter uma pista do que poderia ser. Amigos, familiares, médicos, colegas — ninguém compartilhava a mesma experiência que eu. Eu estava sozinho com meu problema.

O último dia

Em outubro, minha vida mudou drasticamente. Uma dor intensa nos olhos me acordou às 6 da manhã em uma terça-feira, marcando o início de um ciclo de sofrimento que nunca mais se interromperia. Cada dia era a mesma tortura: dores nos olhos, dores de cabeça insuportáveis, falta de memória, ausência de sentimentos e uma sensação de desorientação total me deixavam exausto. Era como se eu estivesse preso em um pesadelo sem fim, impossibilitado de fazer qualquer coisa para escapar.

A parte mais desafiadora era lidar com o mundo físico. Lembro de alguns eventos:

Café

A cozinha se transformava em um labirinto de impossibilidade. Olhando para os utensílios dispostos diante de mim — o café, o filtro, a cafeteira — tudo parecia um enigma indecifrável. O ato simples de preparar um café, que antes era automático, agora se desvanecia em uma névoa de confusão. Minha mente estava como um deserto árido, sem uma gota de clareza. Cada movimento, cada pensamento necessário para a tarefa parecia escorregar entre meus dedos. Eu tentava, com um esforço quase hercúleo, entender o que fazer, mas o café pronto era inalcançável. Assim, permaneci parado, imobilizado e sem café.

Atravessar a rua

Não importava a posição do carro; o simples ato de decidir se eu poderia atravessar a rua parecia uma tarefa impossível. A cada vez que tentava calcular o momento certo, o carro mudava de posição ou alterava a velocidade, tornando a decisão ainda mais confusa. Havia momentos em que eu ficava paralisado, fixando o olhar em um carro que passava, incapaz de decidir se deveria atravessar ou esperar. O mundo ao meu redor se tornava um borrão de movimento e indecisão, e eu me via preso em um ciclo interminável de hesitação e frustração.

Conversa

Certa noite, enquanto caminhava pela rua em um estado quase sonâmbulo, uma conhecida me encontrou e começamos a conversar. A conversa começou de forma amigável, mas logo eu me vi perdido. A sua voz parecia distante, como se estivesse ecoando de um túnel. A cada pergunta dela, eu tentava encontrar uma resposta, mas era como se as palavras fossem sombras fugidias, sempre fora do meu alcance.

Eu não tinha noção do tempo; parecia que minutos e horas se confundiam. Não conseguia lembrar a última coisa que ela havia dito, e a sensação de estar desconectado da realidade me envolvia como um manto pesado. Sentia-me como se estivesse em um pesadelo em que não conseguia acordar, um estranho em seu próprio corpo.

Depois de alguns momentos constrangedores e desconexos, em que eu apenas assentia e tentava sorrir sem saber muito bem por quê, decidi que era melhor me afastar. O constrangimento era insuportável, e o medo de mais interações desastrosas me impulsionou a buscar um lugar de isolamento. Eu precisava resolver minha batalha interna antes de voltar a enfrentar o mundo exterior.

Subida do monte

Diante da crescente tempestade, tomei a decisão de encarar meu problema com a seriedade que ele exigia e iniciei uma transformação radical em meu estilo de vida.

Decorei Leandro Twin + tema e devorei cada vídeo sobre nutrição, atletismo e sono. Adotei uma rotina rigorosa que mesclava exercícios intensos, uma dieta meticulosamente planejada e uma série de estudos. Tabela

Tornei-me cliente VIP da Oficial Farma, abastecendo meu arsenal com valeriana, GABA, 5-HTP, passiflora, ashwagandha, L-triptofano e melatonina.

Na Growth, minha lista de compras incluía: multivitamínico, glutamina, whey protein, hipercalórico, cafeína e óleo de peixe.

Eu me dedicava a bater todas as metas de macronutrientes, vitaminas e minerais diários.

Enquanto isso, passava por uma maratona de exames. Fiz um hemograma completo para eliminar as causas mais comuns. E o resultado? Nada estava fora do normal — eu acreditava que era, de fato, o homem mais bem nutrido da região.

A essa altura, já estava convencido de que o problema não se restringia à nutrição, mas era causado por algo com nome e endereço.

Comecei a realizar exames mais pontuais e, embora os resultados mostrassem que minha testosterona estava em 800 ng/dL e minha tireoide estava em perfeito equilíbrio, nada parecia esclarecer ou resolver a situação.

Nada nos exames indicava o problema, e nada parecia fazer diferença. O problema era como um enigma indomável, intocável e imune a qualquer tentativa de solução. Cada esforço parecia se esbarrar em uma parede de opacidade e resistência, sem deixar vestígios de progresso.

Dezembro

Na noite de natal, o bom Deus me presenteia com a descuberta de uma doença chamada Apneia do Sono.

E que dia meus amigos. Finalmente algo que explicava o meu problema.

Veja: eu acordava sempre no mesmo horario pois a adrenalina acomulava.

2024

Aviso

A apneia bagunçou as minhas memórias, talvez a ordem dos eventos está errada, talvez eu esqueci algumas coisas, talvez eu seja uma alma imortal.

Queria ter documentado todo o processo, mas nunca imaginei que precisaria escrever um livro a respeito. Sempre achava que estava a um passo de uma boa noite de sono.

Se eu soubesse que seria essa fanfara dramatica teria feito um filme.